Nesse mundo magnífico que nos cerca, existem quatro prazeres básicos para o macho viril adulto: o primeiro é bem simples, é o ato de urinar, mais não o corriqueiro do dia a dia, ou o que realizamos quando acordamos pela manhã depois de uma boa noite de sono, e sim quando você está à dezenas de horas “apertado” por impossibilidade de se aliviar e finalmente entra naquele banheiro (tanto faz se é o sublime toilette de uma cobertura do hotel Copacabana Palace ou aquele mictório fedido e detonado de um pé sujo situado a beira de estrada) e com a mão que ficou livre tenta desesperadamente abrir o zíper, mais com a urgência da situação o desfaz em dezenas de pedacinhos e solta aquele jato abençoado que quase fura os ladrilhos de tanta pressão. É como subir aos céus depois de sair de um inferno escaldante.
A segunda sensação dos deuses é entrar em uma distinta menina. Aquela pele doce, cheirosa, o presente divino ofertado aos que merecem (é claro, os leitores que tem outro tipo de preferência também enquadram suas boas experiências nesse quesito).
A terceira é a luta… Enquadro aqui todas as batalhas… A guerra, jiu-jitsu, boxe tailandês, uma briga de bar de amigos bêbados que depois da ressaca sentam-se juntos e riem do ocorrido, uma disputa tensa de xadrez, daquela que verte sangue dos narizes ou uma partida de 5 rounds em The King of Fighters. Virtual ou real, isso é uma fonte inesgotável de testosterona.
Mais hoje vou falar da quarta. Permitida só para os maiores, é o momento em que você entra em seu possante de quatro rodas, liga as luzes, prepara o rádio com aquela “fita” antiga do seu grupo favorito e finalmente torce a chave de ignição no sentido horário, ¼ de volta recebendo aquele som violento e opressor nos ouvidos, que para o macho ogro e viril é equivalente a entrada da quinta sinfonia de Beethoven tocadas por mil músicos profissionais.
É magnífica a sensação de sentir aquele amontoado de quase uma tonelada de ferro, plástico, tecido e combustível altamente inflamável se mover ao comando de suas mãos. Você está no controle de um ser de aço que pode lhe conduzir a caminhos que você nunca iria conseguir trilhar com seus recursos viris mais limitados de ser humano.
Meu desejo sempre foi um Ford Maverick V8, mais infelizmente esse tipo de máquina exige um carinho extremo do seu dono, pois é um jovem senhor de mais de 40 anos de estrada bem ignorante, com um torque extremamente forte e bebedor de combustível voraz, que nem um pinguço na Oktober Fest. Por isso optei por uma máquina preta, estilo Batmóvel com 4 portas e câmbio de cinco marchas manual. Carro de ogro, rústico, suspensão que dói na coluna quando passa em um buraco, com a única frescuragem de ter o controle do rádio e do Bluetooth no volante (necessidades da profissão).
O maior apelo dele é sem dúvida é o câmbio. Objeto fálico moderno, de onde você consegue verter todo o poder de seus tendões e convertê-los em rotações por minuto. No câmbio manual você tem o controle total do seu carro de combate, sabe a hora em que vai castigar a máquina por ela não ter sido boa com você e o exato momento em que ela finalmente vai receber o merecido descanso. É afrodisíaca a vibração do conjunto quando o motor entra em rotação extrema. Tem amigos meus que dizem que um veículo equipado com marcha automática é muito melhor porque ela é mais segura e o sistema computadorizado do carro sabe melhor que você o momento em que as marchas devem ser modificadas, para melhor desempenho, economia de combustível, aumento da vida útil do motor, etc e mais etc. Imagino daqui a alguns anos que eles irão também comprar camas com colchões automáticos que lhe pouparão de fazer os movimentos bruscos e violentos do ato sexual, e controlarão suavemente a frequência das pancadas no traseiro de sua companheira de acordo com o nível dos batimentos cardíacos e da respiração dela até que computadorizadamente de acordo com as necessidades fisiológicas de ambos, os dois cheguem ao orgasmo simultaneamente: ato seguro, involuntário, mecânico, sem hematomas deliciosos e sem graça (sentiram a analogia?). Vai entender.
Brincadeiras à parte, amo dirigir. Se me fosse possível escolher uma profissão diferente da minha atual com certeza seria de motorista sombrio e antissocial estilo Jason Statham em Carga Explosiva, que passava 120 minutos queimando combustível num maravilhoso Audi preto e nos intervalos de descanso, dava porradas com chave inglesa em bandidos e tinha relações extremas e eróticas com mulheres estonteantes sem esquecer de manter o terno completamente impecável (quem toca no meu terno morre).
Quinta feira pela manhã. Trânsito infernal da Zona Sul do Rio de Janeiro, numa subida íngreme na entrada do túnel de São Conrado que me levará a Estrada Lagoa Barra. Provavelmente uns 43 graus no asfalto. Olho em volta e vejo todos os motoristas estressados. Revolta geral. Vejo um senhor de uns 65 anos quase amassando o carro ao lado do dele e estourando seu disco de embreagem para conseguir andar mais 20 centímetros de rua. No Rádio a mensagem: trânsito parado por algumas horas por motivo de revolta em uma favela de São Conrado, moradores colocaram fogo em lixeiras na auto pista e polícia espera reforço para limpar o local.
Parece loucura, mais gostei do que ouvi. Na vida tão exaustiva que tenho, trabalho, academia, aulas, curso, eventos, falta pra mim alguns momentos como esse em que fico só eu e o meu equipamento viril de transporte… É o momento de nossa intimidade máxima, quando ele me mostra do que é feito. Desci um pouco o banco, aumentei o ar condicionado ao máximo, coloquei no potente som uma compilação do disco “The Dark Side of the Moon”, de Pink & Floid e deixei a mente viajar, apreciando a paisagem carioca pela janela escurecida. Pena que não dá pra abrir uma Paulaner Dunkel, pois o lema das estradas é “se dirigir não beba”.