Domingo, 03 horas da manhã. Uma deleitosa madrugada quente de outono. Como todo homem que bebe sua cerveja com exagero, levantei da cama para descarregar aquele excesso de líquido que me incomodava. Não que eu bebesse, na verdade não sou nem muito fã de álcool e seus derivados, pois eles lhe tiram o prazer de estar plenamente consciente de si quando realiza seus mais notáveis atos, mas tenho uma queda por cerveja artesanal e naquela noite tinha acabado de destruir com a graciosa menina um engradado com algumas latinhas de uma maravilhosa cerveja escura e forte, a irlandesa Guiness.
Como a menina tinha sido tão maravilhosa a algumas horas, me proporcionando momentos memoráveis com sua magnífica oscilação corporal, resolvi como recompensa pelo seu desempenho, fazer o possível para não acordá-la e assim segui para o banheiro como um gato preto se esgueirando pelas sombras.
Caminhando meio sonâmbulo pelo corredor escuro daquela casa de bonecas, sem perceber pisei no rabo do seu gato, um gato preto e rabugento que dormia largado no corredor e que já não gostava muito de minha pessoa. Com o pulo do pobre bichano, acordei de meu meio sono de uma vez e para minha felicidade constatei que o miado agudo do infeliz mascote nem sequer a abalou, só fizera com que, ainda dormindo, lentamente puxasse o lençol para cobrir aquele corpinho que estava desprotegido, pois sua vestimenta era somente uma micro calcinha de algodão, a única peça de roupa que conseguiu colocar antes do sono pós coito chegar. Foi uma noite tão intensa que ela nem teve forças para pedir que seu homem a acompanhasse em uma conversa romântica, como é o costume de algumas mulheres, mas dormiu quase que instantaneamente.
Dentro do banheiro, tateei a parede procurando um interruptor de luz. É difícil mapear uma casa que não é sua até chegar nesse nível de detalhes, pois um homem quando chega em um recinto novo inicialmente procura por três coisas: a saída mais próxima, um local seguro para ficar e onde residem os gêneros de primeira necessidade.
O banheiro feminino é uma obra de arte a parte: dezenas de toalhas, perfumes em ricos frascos de nomes e fragrâncias diferentes, tanto shampoos que ela só iria conseguir usar se possuísse dez vezes a quantidade de cabelos, e os lindos, brilhantes e translúcidos sabonetes coloridos. Alguns no box, uns três na pia. Lembrei de uma cena marcante no filme “Vivendo No Limite” (Bringing Out the Dead) dirigido por Martin Scorsese, quando Nicolas Cage pede a Patricia Arquette para lavar as mãos e entra no banheiro de sua casa. Dentro do banheiro ele então fica num momento contemplativo divagando sobre os sabonetes coloridos que estão sobre a pia.
Usei o banheiro direcionando o jato extremamente forte de urina não para o centro, mas para a louça do vaso para não fazer os famigerados sons característicos. Ato equivalente a pegar o fuzil e colocar um silenciador na ponta antes de atirar.
Noite quente, sensações quentes, mulher quente… Do banheiro até a cozinha, para tomar um pouco de água, agora desperto e com uma vontade louca de voltar para o paraíso chamado cama. O gato sumiu, deveria estar em baixo do sofá me xingando em sua silenciosa língua felina, mas que se ferre, ele a possui 24 horas por dia, meu período com ela engloba somente poucos momentos onde tentamos aproveitar cada segundo em que respiramos o mesmo ar doce e perfumado da casa em que vive.
Apaguei a luz antes de terminar o copo. É uma tática militar, que aprendi durante operações à noite: antes de se infiltrar em terreno desconhecido no escuro, sempre acostume seus olhos com a escuridão. Como sua geladeira era cheia de frutas e alimentos odoríferos, a água tinha um sabor diferente e agradável, que me fez ganhar mais alguns minutos na escuridão, tomando-a prazerosamente enquanto caminhava de volta para o quarto.
Parei na porta e, encostado no batente, olhei mais uma vez para aquele visual maravilhoso, aquela estátua viva de deusa grega, caída entre suas dezenas de travesseiros de diversos tamanhos e lençóis brancos que envolviam seu corpo como os véus de seda nas danças marcantes das bailarinas exóticas no antigo Egito.
Sob a tênue luz da lua entrando pela janela contemplei mais uma vez seu corpo. Uma menina pequenina, baixinha. Cabelos compridos, já atingindo a sua cintura, espalhados por toda a extensão da cama, e cobrindo seus lindos seios. Aquele cheiro de produtos para cabelo era tão sutil mas misteriosamente marcava sua presença no ambiente. Acompanhei a curvatura de suas costas, que faziam um desenho sinuoso, uma leve linha que chegava até a sua enorme e firme bunda e que terminava entre as duas covinhas que tinha em cada lado das costas.
Nesse momento o corpo esquentou. Lembrei da putaria louca de tirar o fôlego que fizemos a algumas horas e voltando a técnica do gato preto, sem lançar um só som naquele ambiente, me esgueirei para baixo de seus lençóis com a quase infalível tática de abraçá-la por trás e assim aguçar seu desejo ainda dormindo para mais uma rodada de amor agressivo e sexo selvagem, típica dos grandes amantes que éramos.
Mas uma coisa aconteceu… Ela devia estar tendo um sonho com sua infância, seus parentes ou que estava em algum filme romântico das centenas que adora, pois seu rosto exibia um sorriso leve e quase infantil. Esses lábios me cativaram, e assim minha fêmea erótica e sensual virou para mim, me abraçou e colocou seu rosto em meu peito, como se eu fosse um grande urso de pelúcia. Paralisado, nesse momento fechei os olhos, envolvido no odor tão singelo de seus cabelos, fragrância delicada unida com aquele néctar delicioso do cheiro da sua pele, com as nuances brandas do bálsamo sexual ainda presentes, mesmo após horas de descanso…
Abri os olhos rapidamente, mas já era dia, a vida tinha começado, e seu gato preto e ranzinza estava em cima da cama, me olhando com aquela cara de: “cara, qual é a tua?”.